Como funciona a atualização das aplicações financeiras no exterior?

A Lei 14.754/23, trouxe mudanças significativas na tributação de aplicações financeiras no exterior, dentre as quais podemos citar:

  • Introdução de uma alíquota fixa de 15% para ganhos e rendimentos de aplicações financeiras (anteriormente, a tributação podia chegar a 27,5%);
  • Apuração anual do imposto, diretamente no programa do IRPF (anteriormente, a apuração era mensal em programas apartados);
  • Possibilidade de compensação de perdas com futuros ganhos;
  • Revogação da isenção do IR sobre ganhos nas alienações de pequeno valor (operações de até R$ 35.000,00);
  • Revogação da isenção do IR sobre a variação cambial de aplicações financeiras adquiridas originalmente em moeda estrangeira.

Antes de abordarmos a possibilidade de atualização das aplicações financeiras no exterior, precisamos explicar como era a apuração antes da Lei 14.754/23.

Regra Antiga (antes da Lei 14.754/23)

Os ganhos de capital eram tributados de acordo com a origem dos rendimentos que foram utilizados na compra da aplicação financeira no exterior.

Por exemplo, se a aplicação financeira foi adquirida no exterior com salários recebidos nos EUA durante um período em que a pessoa morava no exterior, a origem do rendimento é em moeda estrangeira.

Por outro lado, se a aplicação financeira foi adquirida no exterior com dividendos recebidos de uma empresa no Brasil, e que foram remetidos ao exterior para adquirir a referida aplicação financeira, a origem do rendimento é em Reais.

Se a origem dos rendimentos era em moeda estrangeira, o ganho de capital era apurado em USD (ou seja, valor de alienação em USD menos o custo de aquisição em USD), sendo que o ganho era tributado a uma alíquota progressiva de 15% a 22,5%.

Se a origem dos rendimentos era em Reais, o ganho de capital era apurado em Reais (ou seja, valor de alienação convertido para Reais na data da alienação menos o custo de aquisição convertido para Reais na data de aquisição), sendo que o ganho era tributado a uma alíquota progressiva de 15% a 22,5%.

Isso quer dizer que, na regra antiga, a variação cambial só era tributada no caso de aplicações financeiras adquiridas com recursos auferidos em Reais. Veja o seguinte exemplo:

Compra de ações da Apple, em junho/2019, por USD 50 a uma taxa de câmbio de 4,00.
Venda de ações da Apple, em abril/2023, por USD 160 a uma taxa de câmbio de 5,00.

Apuração em USD (para aplicações financeiras com origem em moeda estrangeira)

Ganho de capital em USD = USD 160 – USD 50 = USD 110
Ganho de capital em Reais = USD 110 x 5,00 = R$ 550
Imposto sobre o ganho = R$ 550 x 15% = R$ 82,50


Apuração em Reais (para aplicações financeiras com origem em Reais)

Custo de aquisição em Reais = USD 50 x 4,00 = R$ 200
Valor de venda em Reais = USD 160 x 5,00 = R$ 800
Ganho de capital em Reais = USD 800 – USD 200 = USD 600
Imposto sobre o ganho = R$ 600 x 15% = R$ 90,00

Observe que a diferença de imposto refere-se a 15% sobre a variação cambial (diferença entre a taxa de 4,00 para 5,00) aplicada sobre o custo de aquisição de USD 50.

Ou seja, USD 50 x (5,00 – 4,00) x 15% = R$ 7,50

Portanto, quando a aplicação financeira era adquirida em moeda estrangeira (apuração em USD), havia a isenção de imposto sobre a variação cambial.

Por outro lado, quando a aplicação financeira era adquirida em Reais (apuração em Reais), a variação cambial era tributada normalmente.

Regra Nova (a partir da Lei 14.754/23)

Como falamos anteriormente, agora a alíquota é fixa em 15% e deixou de existir a isenção sobre a variação cambial.

Isso quer dizer que, com a nova regra, o ganho de capital será sempre apurado em Reais (conforme exemplo dado anteriormente).

Em paralelo, a Lei 14.754/23 está dando uma oportunidade para que as pessoas atualizem o valor das aplicações financeiras no exterior, ao valor de mercado em 31/12/2023 (pela taxa de câmbio de 4,8413), pagando uma alíquota reduzida de 8% sobre essa atualização.

Mas atenção: essa opção só vale para aplicações financeiras adquiridas até 31/12/2022 e que permaneceram na posse da pessoa até 31/12/2023. Ou seja, não vale para aplicações financeiras adquiridas ou liquidadas durante o ano de 2023.

Vejamos um exemplo prático de como funciona essa atualização:

Compra de ações da Apple, em junho/2019, por USD 50 a uma taxa de câmbio de 4,00.
Valor de mercado das ações, em 31/12/2023, de USD 130 a uma taxa de câmbio de 4,8413.

Atualização da Lei 14.754/23 (para aplicações financeiras com origem em moeda estrangeira)

Custo de aquisição em Reais = USD 50 x 4,8413 = R$ 242,07
Valor de mercado em Reais = USD 130 x 4,8413 = R$ 629,37
Atualização da aplicação financeira = R$ 629,37 – R$ 242,07 = R$ 387,30
Imposto sobre a atualização = R$ 387,30 x 8% = R$ 30,98


Atualização da Lei 14.754/23 (para aplicações financeiras com origem em Reais)

Custo de aquisição em Reais = USD 50 x 4,00 = R$ 200,00
Valor de mercado em Reais = USD 130 x 4,8413 = R$ 629,37
Atualização da aplicação financeira = R$ 629,37 – R$ 200,00 = R$ 429,37
Imposto sobre a atualização = R$ 429,37 x 8% = R$ 34,35

Observe que a diferença de imposto refere-se a 8% sobre a variação cambial (diferença entre a taxa de 4,00 para 4,8413) aplicada sobre o custo de aquisição de USD 50.

Ou seja, USD 50 x (4,8413 – 4,00) x 8% = R$ 3,37

Portanto, para as aplicações financeiras adquiridas em moeda estrangeira, a Lei permite atualizar o custo de aquisição à taxa de 4,8413, de forma que os 8% não incidam sobre a variação cambial.

Já para as aplicações financeiras adquiridas em Reais, o imposto de 8% deve ser pago, inclusive, sobre a variação cambial incorrida até 31/12/2023.

E como fica o imposto a partir de 01/01/2024?

Quem escolher pela atualização das aplicações financeiras no exterior, mediante pagamento dos 8%, poderá aumentar o custo de aquisição declarado no IRPF, de tal forma que, quando a aplicação financeira for liquidada, o ganho de capital a ser tributado pela nova alíquota de 15% será menor.

Quem escolher pela não atualização das aplicações financeiras no exterior, manterá o custo de aquisição histórico no IRPF, de tal forma que, quando a aplicação financeira for liquidada, o ganho de capital a ser tributado pela nova alíquota de 15% será o ganho “cheio” daquela aplicação.

Quando é vantajoso pagar os 8%?

Conforme vimos anteriormente, a nova alíquota do IR sobre os ganhos de capital é de 15%.

Ou seja, se você não atualizar o valor das aplicações financeiras no exterior ao valor de mercado em 31/12/2023, mediante pagamento dos 8%, você acabará pagando um imposto de 15% quando liquidar essa aplicação financeira.

Então qual é a “pegadinha”: o imposto de 8% precisa ser pago até 31/05/2024, independentemente de você ter liquidado a aplicação financeira. Por outro lado, a tributação normal de 15% só incidirá em 31/maio do ano seguinte ao da liquidação da aplicação financeira.

Essa decisão pode ser tomada individualmente para cada aplicação financeira no exterior (ex: ação por ação, bond por bond, fundo por fundo); e o valor de mercado será aquele constante no extrato do banco em 31/12/2023, convertido pela taxa de 4,8413.

Portanto, a pergunta é a seguinte:

  • Você prefere pagar 8% antecipadamente sobre um ganho ainda não realizado? ou
  • Você prefere pagar a alíquota normal de 15% somente quando realizar o ganho?

Se você pretende liquidar a aplicação financeira nos próximos anos, provavelmente será mais barato pagar 8% antecipadamente. Caso contrário, pode ser melhor pagar 15% só no futuro.

Essa é uma decisão muito pessoal e que deve ser tomada de forma consciente, com o apoio do seu assessor jurídico, do assessor financeiro e do contador.

Compartilhe nas redes:

Posts Relacionados