As pessoas jurídicas optantes pelo Lucro Presumido no Regime de Caixa, precisam estar atentas a algumas operações que, apesar de não representarem ingresso de recursos, podem estar sujeitas a tributação.
Dentre essas operações, podemos citar: 1) descontos condicionais concedidos; e 2) perdas no recebimento de créditos.
Qual o fato gerador dos tributos federais no Lucro Presumido Regime Caixa?
A base de cálculo do IRPJ e da CSLL é apurada com base na aplicação de um percentual sobre a receita bruta; deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos; e somadas todas as demais receitas e ganhos, nos termos do art. 215 da Instrução Normativa RFB nº 1.700/17.
O § 9º do mesmo artigo, prevê a possibilidade de reconhecimento das receitas pelo regime de competência ou de caixa.
No regime de caixa, as receitas são reconhecidas na medida do seu recebimento.
Quando uma empresa concede um desconto condicional ou quando reconhece uma perda no recebimento de créditos, tendo em vista que tais valores não são efetivamente recebidos pela empresa, pode parecer, em uma primeira análise, que tais valores podem deixar de ser tributados.
O objetivo desse post é mostrar que o assunto não é tão simples assim; e avaliar o possível entendimento da Receita Federal sobre esse tema.
Descontos condicionais concedidos
Primeiro, vamos falar dos descontos incondicionais, que são aqueles concedidos diretamente na nota fiscal, ou seja, que não dependerem de evento posterior à emissão desses documentos.
Esse tipo de desconto pode ser deduzido da receita bruta da pessoa jurídica, assim como as devoluções e as vendas canceladas.
Já os descontos condicionais são aqueles que dependem de evento posterior à emissão da nota fiscal (ex: pelo pagamento dentro do prazo), e configuram despesa financeira para o vendedor e receita financeira para o comprador.
Não existe previsão legal para a dedução dos descontos condicionais concedidos da base de cálculo dos tributos federais no lucro presumido.
Dessa forma, na medida em que a pessoa jurídica concede um desconto condicional, recebendo um valor menor do que aquele que constou na nota fiscal, ocorrem os seguintes fenômenos:
- A pessoa jurídica dá quitação total do saldo a receber perante o cliente;
- A pessoa jurídica reconhece o recebimento da parcela paga pelo cliente;
- A pessoa jurídica reconhece uma despesa financeira pelo desconto concedido.
Como já vimos anteriormente, a base de cálculo do Lucro Presumido é apurada com base em um percentual de presunção aplicado sobre a receita bruta (que, na maioria dos casos, corresponde às notas fiscais emitidas).
No entanto, no regime de caixa, ocorre um diferimento do recolhimento dos tributos federais para o momento do recebimento da receita bruta.
Na medida em que a nota fiscal é recebida, ainda que por um valor menor, a Receita Federal pode entender que a quitação do saldo a receber enseja a tributação da receita bruta total, não permitindo a dedução do desconto condicional, exceto no caso de atividade imobiliária.
A Receita Federal já se pronunciou, por meio da Solução de Consulta Cosit nº 106/2020, no sentido de que a atividade imobiliária (i.e. loteamento de terrenos, incorporação imobiliária e venda de imóveis construídos ou adquiridos para revenda) tem regramento próprio (art. 30 da Lei nº 8.981, de 1995), no qual a receita bruta corresponde aos montantes efetivamente recebidos pela venda de unidades imobiliárias.
Já as empresas de outros segmentos entrariam na regra geral, em que a receita bruta compreende o produto da venda de bens, o preço da prestação de serviços, as demais receitas da atividade principal da empresa e o resultado de intermediações.
Perdas no recebimento de créditos
Uma situação análoga ocorre quando a empresa reconhece uma perda no recebimento de créditos originados de uma receita bruta.
No momento em que a perda é reconhecida, o saldo a receber é baixado e, ao mesmo tempo, é registrada uma despesa decorrente da perda.
Como já vimos anteriormente, não há previsão legal para a dedução de perdas no recebimento de créditos da base de cálculo dos tributos federais no lucro presumido.
Dessa forma, na medida em que o saldo a receber é baixado, a Receita Federal pode entender que a receita bruta relativa a essa operação deve ser integralmente tributada, não permitindo a dedução da perda incorrida.
Regime Caixa no Simples Nacional
No Simples Nacional, as situações abordadas acima foram devidamente regulamentadas pela Resolução CGSN nº 38/2008, que determina que nas operações a prazo, a parcela não vencida deverá ser tributada até o final do ano seguinte ao da respectiva operação.
Além disso, as receitas auferidas e não recebidas serão tributadas por ocasião do encerramento da empresa; mudança para o regime de competência; ou, na exclusão do Simples Nacional.
Apesar de o dispositivo acima não ser aplicável às empresas do Lucro Presumido, ela nos dá uma indicação de como a Receita Federal pode interpretar esse tipo de situação.
Considerações Finais
Em resumo, no lucro presumido, o que se tributa é o “faturamento” e não “montantes recebidos”.
No lucro presumido apurado no regime de competência, não há essa problemática, já que a tributação ocorre no momento do faturamento (ex: emissão da nota fiscal), independentemente do seu efetivo recebimento.
Já no regime de caixa, o que se tributa continua sendo o “faturamento”. Mas, nesse caso, ocorre o diferimento da tributação para o momento do recebimento, ou, de forma mais ampla, na baixa do contas a receber.
Em outras palavras, no momento em que o contas a receber é baixado (seja pelo recebimento, seja pelo desconto condicional, seja pelo reconhecimento da perda), deve-se oferecer à tributação o “faturamento” relativo àquela baixa, ou seja, tributa-se o valor total da nota fiscal emitida.
Sob a ótica do direito tributário, quando se analisa a regra-matriz de incidência tributária no lucro presumido, não parece adequado pressupor que possa haver diferença no critério material e/ou quantitativo entre o regime de caixa e competência, caso contrário estaríamos diante de um novo regime tributário, em que os descontos condicionais e perdas seriam dedutíveis da base de cálculo do lucro presumido, o que nos pareceria uma aberração.
No momento em que é concedido um desconto condicional ou reconhecida uma perda, materializa-se o critério temporal do regime de caixa, fazendo nascer a obrigação tributária dos tributos federais.
Não obstante os pontos abordados acima, entendemos que se trata de um assunto polêmico e que pode comportar diferentes entendimentos doutrinários.
Dessa forma, se a sua empresa é optante pelo lucro presumido no regime de caixa, recomendamos que você consulte um advogado tributarista para lhe ajudar na melhor interpretação jurídica para esse tema.