O perdão de dívida deve ser tributado?

No Direito Civil, o perdão de dívida (também chamado de remissão de dívida) ocorre quando o credor desiste de um valor que teria direito a receber, em benefício do devedor, com a consequente extinção da obrigação, mediante anuência do devedor (aceitação expressa ou tácita) e independentemente do vencimento da obrigação.

Essa operação, sem sombra de dúvidas representa um aumento no patrimônio da empresa que recebeu o perdão de dívidas, na medida em que tal empresa deixa de reconhecer um passivo que anteriormente existia e era devido.

No entanto, resta saber se a empresa que recebe o perdão de dívida deve tributar esse aumento de patrimônio.

Se você também tem essa dúvida, acompanhe este post até o final!

Tratamento tributário do Perdão de Dívida

A empresa devedora, antes do perdão da dívida, mantinha registrada a obrigação em seu Passivo Circulante (se exigível dentro de um período de 1 ano) ou no Passivo Não Circulante (se exigível após o período de 1 ano).

Na medida em que a dívida é perdoada pelo credor, o devedor “baixa” a obrigação do seu Passivo Circulante ou Passivo Não Circulante e, ao mesmo tempo, reconhece uma receita no resultado do período.

De acordo com a Solução de Consulta nº 65/19, a natureza da receita decorrente do perdão de dívidas dependerá da natureza da dívida que a gerou:

“Na hipótese de empréstimos ou financiamentos, ter-se-á uma receita financeira – como esclarece o Ato Declaratório SRF nº 85/99. Tratando-se de dívidas perante fornecedores de mercadorias, estar-se-á diante de uma recuperação de custos e despesas – conforme art. 441, inciso II, do RIR/2018. No caso de redução de multa e juros relativos a tributos, enquadra-se a receita nesse mesmo dispositivo do RIR/2018, como recuperação ou devolução de custo ou despesa.”

Dessa forma, podemos ver que o tratamento tributário depende da natureza da dívida que foi objeto de remissão.

Sendo assim, analisaremos os efeitos tributários de cada uma dessa situações nos diferentes regimes de tributação.

Lucro Presumido

IRPJ e CSLL

De acordo com a Lei nº 9.430/96, para fins de apuração do IRPJ e CSLL, deve ser adicionada à base de cálculo desses tributos os ganhos de capital, os rendimentos de aplicações financeiras e os resultados positivos decorrentes de outras receitas auferidas pela empresa.

Por outro lado, o art. 53 da mesma Lei, determina que os custos e despesas recuperados deverão ser adicionados à base de cálculo do IRPJ e CSLL, exceto se o custo ou a despesa foram originariamente incorridos em um período em que a empresa era optante pelo Lucro Presumido ou, na hipótese de ter sido optante pelo Lucro Real, não tenha deduzido tais custos e despesas na apuração do IRPJ e CSLL.

Ou seja, se a natureza do perdão de dívida for a de receita financeira, a empresa deve oferecer essa receita à tributação do IRPJ e da CSLL.

Por outro lado, se a natureza for de recuperação de custos e despesas, tendo esses custos e despesas sido incorridos dentro do regime do Lucro Presumido, a receita decorrente do perdão de dívidas não será tributada pelo IRPJ e CSLL.

PIS e COFINS

Já em relação ao PIS e à COFINS, o art. 2º da Lei nº 9.718/98 e o art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77 determinam que tais tributos sejam calculados sobre o “Faturamento” da empresa, que compreende a venda de mercadorias, a prestação de serviços e as demais receitas relativas ao objeto social da empresa.

Caso o perdão de dívidas não tenha relação com o objeto social da empresa, não haverá incidência de PIS e COFINS sobre essa receita, independentemente da natureza do perdão de dívidas.

Por outro lado, existem hipótese em que o perdão de dívida tem relação direta com a atividade da empresa.

Por exemplo, a Solução de Consulta nº 109/2020 aborda a situação de uma empresa que comercializa produtos de uso animal e que comprou mercadorias que não passaram no teste do produto, de forma que o fornecedor concedeu o perdão da dívida na compra dessa mercadoria que seria objeto de posterior revenda. Neste caso, a Receita Federal entendeu que a recuperação do custo tem relação direta com o objeto social da empresa e, portanto, está compreendida no conceito de “Faturamento” para fins de apuração do PIS e da COFINS, devendo ser tributada.

Lucro Real

IRPJ e CSLL

No Lucro Real, tendo em vista que as apurações do IRPJ e da CSLL partem do lucro contábil, podemos considerar que, independentemente da sua forma de contabilização, o perdão de dívida será sempre tributado, partindo-se do pressuposto que a receita decorrente do perdão de dívidas já estará computada dentro do resultado do período.

PIS e COFINS

Para as empresas do Lucro Real que estiverem sujeitas ao regime cumulativo, aplicar-se-ão as regras tributárias conforme abordado acima para as empresas do Lucro Presumido.

Por outro lado, para as empresas que estiverem sujeitas ao regime não-cumulativo, o art. 1º da Lei nº 10.637/02 e o art. 1º da Lei nº 10.833/03 determinam que o PIS e a COFINS incidirão sobre a totalidades das receitas auferidas pela empresa, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, sendo que as receitas relativas ao objeto social da empresa são tributadas pelas alíquotas normais (1,65% e 7,6%) e as receitas financeiras são tributadas por alíquotas específicas (0,65% e 4%).

Neste sentido, se o perdão de dívidas tiver relação com o objeto social da empresa, as alíquotas aplicáveis serão de 1,65% para o PIS e 7,6% para a COFINS.

Por outro lado, conforme a Solução de Consulta nº 176/18 e o Ato Declaratório SRF nº 85/99, se o perdão de dívida for caracterizado como receita financeira, as alíquotas aplicáveis serão de 0,65% para o PIS e 4% para a COFINS.

Simples Nacional

Por fim, para as empresas optantes pelo Simples Nacional, o art. 3º da Lei Complementar nº 123/06 determina que a base de cálculo do Simples Nacional será a receita bruta da empresa, que compreende apenas a venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia.

Dessa forma, tendo em vista que a receita decorrente do perdão de dívidas não está inserida no conceito de receita bruta na legislação do Simples Nacional, podemos dizer que as empresas optantes pelo Simples Nacional não devem tributar as receitas decorrentes do perdão de dívidas.

Conclusão

Com base em todo o exposto, os efeitos tributários do perdão de dívidas dependem de cada situação, sendo que ainda não há uma uniformidade de entendimento por parte do CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) e, ainda assim, o entendimento do CARF, por vezes, não encontra respaldo na jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal).

Dessa forma, entendemos que o caminho mais conservador é aplicar o entendimento contido neste post, que reflete o entendimento da Receita Federal.

Por outro lado, se você deseja aplicar um entendimento diverso, recomendamos que você busque assessoramento jurídico para analisar o seu caso específico.

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