Se você chegou até aqui é porque já deve ter ouvido falar que é possível economizar muito imposto na venda de infoprodutos (mais especificamente, e-books), correto?
Cuidado quando você se deparar com propostas mirabolantes que prometem uma carga tributária de 2,28% ou algo do tipo.
Existem sim formas legais de reduzir a carga tributária na venda de e-books, mas é preciso estar atento a todas as pegadinhas.
Se você quer saber tudo sobre a tributação dos e-books, acompanhe este post até o final!
Súmula Vinculante do STF
Esse assunto ganhou muito destaque quando, em março de 2017, o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou que, nos termos do artigo 150, inciso VI, alínea “d”, da Constituição Federal, a imunidade tributária aplicável aos “livros” também se estendia aos “livros eletrônicos” (e-books).
O julgamento em questão se referia a uma editora de livros do Rio de Janeiro que vendia uma “Enciclopédia Jurídica Eletrônica” gravada em CD. Para o governo do estado do Rio de Janeiro, o livro eletrônico seria diferente do livro impresso e, por isso, não deveria ter o benefício da imunidade.
No entanto, para o relator da ação, ministro Dias Toffoli, a interpretação da Constituição Federal deveria levar em consideração a finalidade da norma, os avanços tecnológicos e a questão ambiental relativa à redução do uso de papel. Para o ministro, a imunidade tributária se aplica à obra literária propriamente dita, independentemente do meio em que ela é disponibilizada ao leitor.
Dessa forma, o STF passou a considerar que os livros eletrônicos (e-books), os livros gravados em áudio (audio-books) e os aparelhos leitores de livros eletrônicos (e-readers) estão imunes de ICMS.
Imunidade de ICMS
Com o referido julgamento do STF, os estados (responsáveis pela cobrança do ICMS) tiveram que adotar o entendimento de que os e-books estariam imunes de tributação. No entanto, cada estado começou a criar limitações para evitar que as empresas passassem a considerar todo e qualquer produto digital escrito como um “e-book”, procurando se aproveitar indevidamente da imunidade tributária.
Por exemplo, segundo a Resposta à Consulta nº 19663/19, o estado de São Paulo passou a entender que para fazer jus à imunidade tributária do ICMS o e-book deveria representar uma versão eletrônica do que seria considerado um “livro” em sua concepção usual e clássica; e, além disso, o objeto social da empresa deveria contemplar a atividade de venda de livros digitais, com a correspondente inclusão dessa atividade nos cadastros do CNPJ e da Inscrição Estadual.
Portanto, todas as operações envolvendo a venda de bens e mercadorias digitais, por meio de transferência eletrônica de dados, que não atendam às especificações acima, estarão sujeitas à incidência de ICMS e, consequentemente, sujeitas às regras contidas na Portaria CAT 24/18, no Convênio ICMS 106/17 e no Decreto 63.099/17.
Ou seja, independentemente de os e-books gozarem de imunidade tributária, isso não desobriga a empresa que o comercializa à emissão de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) e todas as demais obrigações acessórias estaduais (ex: GIA, SPED-Fiscal, etc.).
Vale lembrar que o ICMS é um imposto incidente sobre a circulação de mercadorias, ainda que de forma eletrônica. Ou seja, se não ocorrer a transferência do conteúdo de forma definitiva para o consumidor final, não há que se falar em incidência do ICMS e tampouco de emissão de NF-e de venda de mercadoria. No entanto, neste caso, a venda do infoproduto será considerada uma prestação de serviço que, como veremos, tem uma tributação mais alta.
Por exemplo, uma empresa que fornece uma plataforma eletrônica em que o consumidor final tem acesso a diversos conteúdos on-line, mas sem realizar o download do conteúdo, essa operação está fora da competência dos estados de cobrar o ICMS, já que não houve a circulação do produto digital, mas estará sujeita ao ISS, para o qual não há nenhum tipo de imunidade.
Alíquota Zero de PIS e COFINS
Nesta mesma linha de raciocínio, poderíamos pensar que a alíquota zero de PIS e COFINS aplicável aos “livros” também se estenderiam aos e-books, correto?
Ocorre que não.
Isso porque a Lei nº 10.865/04, que instituiu a alíquota zero para os “livros”, determina que ela só se aplica aos livros que se enquadrem na definição da Lei nº 10.753/03, que é a seguinte:
Art. 2º Considera-se livro, para efeitos desta Lei, a publicação de textos escritos em fichas ou folhas, não periódica, grampeada, colada ou costurada, em volume cartonado, encadernado ou em brochura, em capas avulsas, em qualquer formato e acabamento.
Parágrafo único. São equiparados a livro:
I – fascículos, publicações de qualquer natureza que representem parte de livro;
II – materiais avulsos relacionados com o livro, impressos em papel ou em material similar;
III – roteiros de leitura para controle e estudo de literatura ou de obras didáticas;
IV – álbuns para colorir, pintar, recortar ou armar;
V – atlas geográficos, históricos, anatômicos, mapas e cartogramas;
VI – textos derivados de livro ou originais, produzidos por editores, mediante contrato de edição celebrado com o autor, com a utilização de qualquer suporte;
VII – livros em meio digital, magnético e ótico, para uso exclusivo de pessoas com deficiência visual;
VIII – livros impressos no Sistema Braille.
Dessa forma, considerando que as normas tributárias devem ser interpretadas de forma literal e restritiva, podemos dizer que só se aplica a alíquota zero de PIS e COFINS aos e-books quando forem para uso exclusivo de pessoas com deficiência visual.
Outra hipótese em que se aplica a alíquota zero aos e-books é quando o seu conteúdo derivar de um livro publicado no formato tradicional, ou de originais de livro ainda não publicado, desde que a obra seja produzida por editores, mediante contrato de edição celebrado com o autor. Exemplo: as mídias digitais que acompanham os livros impressos e que contenham conteúdo idêntico, parcial ou suplementar ao da obra física (ainda que não seja para uso exclusivo de pessoas com deficiência visual), também gozam de alíquota zero de PIS e COFINS.
Esse é o entendimento da Receita Federal, conforme a Solução de Consulta nº 393/17.
Tributação na venda de infoprodutos
A maioria dos infoprodutos consiste em uma prestação de serviços (ex: cursos, videoaulas, mentorias, etc.). O problema é que os serviços são tributados pelo ISS e não há nenhum tipo se imunidade tributária aplicável a esses serviços.
Portanto, para que você possa aplicar a imunidade do ICMS, você precisa caracterizar o seu infoproduto como venda de mercadoria. Como já dissemos anteriormente, o fisco estadual tem uma série de requisitos para considerar a operação como venda de e-book. Se você não seguir todos esses requisitos à risca, você estará colocando a sua empresa em risco.
Agora veja a comparação da carga tributária incidente sobre um infoproduto no geral (caracterizado como uma prestação de serviço) em comparação com a venda de um e-book (caracterizado como uma venda de mercadoria digital):
Tributos | Simples Nacional | Lucro Presumido | ||
---|---|---|---|---|
Infoproduto | E-book | Infoproduto | E-book | |
IRPJ | 4,80% | 1,20% | ||
CSLL | 2,88% | 1,08% | ||
PIS | 0,65% | 0,65% | ||
COFINS | 3,00% | 3,00% | ||
ISS | 5,00% | |||
Simples | 10,56% | 4,78% | ||
Total | 10,56% | 4,78% | 16,33% | 5,93% |
Acima nós simulamos uma empresa que fatura R$ 50.000,00/mês como um mero exemplo. Como as alíquotas do Simples Nacional sofrem variação de acordo com o faturamento, você pode fazer outras simulações usando a nossa Calculadora do Simples Nacional. Obs: Quando estiver usando a nossa calculadora, considere que a venda de infoprodutos se enquadra no Anexo III e a venda de e-books no Anexo I. O percentual mostrado na calculadora para o Anexo I contemplam o ICMS. Para “retirar” o ICMS, basta multiplicar a alíquota por 0,665. Por exemplo, uma empresa que fatura R$ 600.000,00/ano teria uma alíquota de 7,19% (com ICMS) ou 7,19% x 0,665 = 4,78% (sem ICMS). |
Portanto, quando alguém lhe disser que é possível pagar 2,28% de tributação na venda de e-books, essa pessoa está se referindo ao regime do Lucro Presumido, considerando a alíquota zero de PIS e COFINS.
Como já vimos, a menos que o seu e-book seja para uso exclusivo de pessoas com deficiência visual, note que há um risco nesse tratamento tributário.
Cuidados especiais na venda de e-books
Como vimos anteriormente, se você pretende se beneficiar da imunidade de ICMS na venda de e-books, é necessário seguir à risca todos os requisitos estipulados pelo fisco para não correr nenhum risco.
Veja a seguir os principais pontos de atenção que você deve observar:
1 – Livro tradicional em formato eletrônico
Como já vimos anteriormente, o fisco irá analisar se o e-book de fato é um livro (na concepção mais usual dessa palavra no dia-a-dia) mas em um formato eletrônico.
Quaisquer elementos que destoem o seu produto do que seria um “livro tradicional em formato eletrônico”, o fisco poderá se valer desses elementos para cobrar o ICMS da sua empresa. E lembre-se: o fisco pode retroagir a cobrança referente aos últimos 5 anos.
2 – Comunicação da oferta ao público
Outro ponto de especial atenção é como você comunica a sua oferta ao público.
Para que a operação seja enquadrada como venda de e-book, é importante que você oferte o produto de maneira condizente nas diversas plataformas (Hotmart, Eduzz, Clickbank, Monetizze, Amazon, etc.).
A maioria das plataformas de venda de infoprodutos possui uma classificação própria para e-books. Além de criar o anúncio na classificação correta, é importante que toda a comunicação sobre o produto seja condizente com a de “livro tradicional em formato eletrônico”.
3 – Preço do e-book
É importante que o preço do e-book siga parâmetros normais de mercado.
Por exemplo, não adianta vender um e-book por R$ 1.000,00 onde o cliente “ganha de brinde” um curso online totalmente gratuito.
Pesquise na Amazon por livros da mesma categoria que o seu e-book. Se você ofertar o seu e-book por qualquer valor que seja muito discrepante da média dos demais livros e que esteja associado a alguma outra vantagem (ex: acesso a determinado site ou curso online), logicamente o fisco poderá autuar a sua empresa.
4 – Download do e-book
Para que a operação de venda de e-book seja considerada como venda de mercadoria, é necessário que o cliente faça o download do e-book de forma “definitiva”, ou seja, é necessário que haja a “circulação da mercadoria” para que seja concretizada a venda.
Portanto, não basta apenas disponibilizar o acesso ao conteúdo do e-book. O cliente precisa obrigatoriamente fazer o download.
5 – Objeto social de venda de livros digitais
É importante que o Contrato Social da empresa inclua o objeto social de edição e venda de livros digitais.
Consequentemente, o CNPJ da empresa deve conter os seguintes CNAEs: 5811-5/00 (Edição de livros) e 4761-0/01 (Comércio varejista de livros); além de obter a Inscrição Estadual junto à Secretaria da Fazenda do Estado.
Um negócio digital que não se utiliza da imunidade de ICMS normalmente não possui registro perante o governo estadual. No entanto, a partir do momento que você oficializa a atividade de comércio de livros digitais, a sua empresa passa a entrar no “radar” de mais um ente governamental, que é a Secretaria da Fazenda do estado em que a sua empresa está sediada.
Outro aspecto importante é que não pode existir mais do que uma empresa com Inscrição Estadual dentro do mesmo endereço. Portanto, dependendo de onde a sua empresa estiver sediada, talvez não seja permitido abrir uma empresa de comércio de livros.
6 – Emissão de NF-e e Obrigações Acessórias
Uma vez que a sua empresa se torna um “comércio de livros digitais”, passa a ser necessário emitir nota fiscal de venda de mercadoria (NF-e) sempre que você vende um e-book.
Note que a nota fiscal de venda de mercadoria (NF-e) é bem mais complexa do que a nota fiscal de serviço (NFS-e). Além disso, a sua empresa passa a estar obrigada a entregar uma série de obrigações acessórias para o fisco estadual, como a GIA, o SPED-Fiscal, etc.
Neste ponto, contar com um contador especializado em infoprodutores e negócios digitais é imprescindível para que a sua empresa não corra riscos.
7 – Registrar o e-book no ISBN
Para que você assegure os direitos literários da obra que será comercializada, é importante registrar o e-book no ISBN (International Standard Book Number System).
O registro no ISBN atualmente é realizado pela Câmara Brasileira do Livro, sendo que é possível registrar quaisquer textos ou criações autorais que saíram do campo das ideias e foram materializados. Ou seja, não é possível registrar ideias que ainda não tenham sido materializadas ou que contenham obras de terceiros.
Assim, além de evidenciar que o seu e-book realmente se trata de um “livro tradicional em formato eletrônico”, você garante que outras pessoas não irão plagiar o seu conteúdo.
Conclusão
É possível se utilizar da imunidade tributária na venda de livros eletrônicos (e-books), no entanto, é importante que você esteja atento a todos os requisitos do fisco para não colocar a sua empresa em risco.
Se você utilizar artifícios para se aproveitar indevidamente dessa imunidade tributária e o fisco detectar, isso pode ser caracterizado como uma sonegação fiscal, que é um crime previsto em lei e sujeito a sanções penais.
Fique atento que existem muitas empresas no mercado vendendo a ideia de que todos os infoprodutos estão imunes de tributação, o que, como vimos, não é verdade.
Em caso de dúvida, entre em contato com a Ozai, contabilidade especializada no atendimento a infoprodutores e negócios digitais!