Posso comprar e vender imóveis na pessoa física de forma habitual e recorrente?

Essa pergunta pode parecer simples em um primeiro momento, mas ela esconde algumas questões importantes a serem consideradas por aqueles que realizam operações imobiliárias com habitualidade.

Se este é o seu caso, acompanhe este post até o final.

Equiparação a Pessoa Jurídica

O art. 966 do Código Civil estabelece que a pessoa que exerce profissionalmente qualquer atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços será considerada uma Empresa Individual.

Essa regra só não se aplica aos profissionais liberais, que são aqueles que exercem profissão intelectual, científica, literária ou artística.

Do ponto de vista tributário, o art. 41 da Lei nº 4.506/1964 determina que as pessoas físicas que explorem qualquer atividade econômica, mediante venda de bens ou serviços a terceiros serão equiparados a pessoa jurídica.

Mais especificamente, o art. 162, §1º, do Regulamento do Imposto de Renda, diz que as pessoas físicas que explorem de forma habitual e profissional qualquer atividade econômica de natureza civil ou comercial, com finalidade de lucro, por meio da venda de bens ou serviços a terceiros, serão equiparados a pessoa jurídica para fins tributários.

O termo equiparação a pessoa jurídica significa que aquela pessoa, apesar de não ser verdadeiramente uma pessoa jurídica, será tratada, para fins tributários, como se fosse uma pessoa jurídica.

Ou seja, quando ocorre a equiparação a pessoa jurídica, isso quer dizer que a pessoa física terá que inscrever-se como Empresa Individual perante a Junta Comercial, além de obter o registro no CNPJ, passando a ter todas as obrigações tributárias que uma pessoa jurídica teria, como, por exemplo: terá que optar por um dos regimes tributários aplicáveis às pessoas jurídicas (Simples Nacional, Lucro Presumido ou Lucro Real), terá que manter escrituração contábil de todas as suas operações e deverá entregar todas as obrigações acessórias ao fisco.

Operações imobiliárias sujeitas a equiparação a pessoa jurídica

O art. 151 do Regulamento do Imposto de Renda lista algumas operações imobiliárias que são automaticamente equiparadas a pessoa jurídica:

  • Incorporação imobiliária, que é a construção de uma edificação composta de unidades autônomas que serão vendidas total ou parcialmente antes da conclusão das obras;
  • Loteamento, que é a subdivisão de uma gleba em lotes, destinados a posterior edificação, com abertura, ampliação ou prolongamento de ruas e vias de circulação;
  • Desmembramento de imóvel rural em mais de 10 lotes ou a alienação de mais de 10 quinhões ou frações ideais de imóvel rural.

Dessa forma, qualquer atividade de incorporação imobiliária ou loteamento, ainda que realizadas de forma eventual por pessoas físicas, serão obrigatoriamente tributadas no Lucro Presumido ou no Lucro Real (já que tais atividades são impedidas de optar pelo Simples Nacional).

Para entender melhor como se dá a tributação na venda de imóveis por uma holding patrimonial, acesso no nosso conteúdo: Qual a Tributação na Venda de Imóveis por uma Holding Patrimonial

A equiparação a pessoa jurídica ocorre inclusive na hipótese em que a pessoa física, proprietária de uma área de terra, associa-se com uma pessoa jurídica para executar e promover o empreendimento de loteamento, com o produto da venda das unidades imobiliárias rateado entre as partes na proporção contratualmente estipulada (Parecer Normativo CST nº 15/1984).

Demais operações sujeitas a equiparação a pessoa jurídica

Como já vimos, as operações de incorporação imobiliária e loteamento, quando realizadas por pessoas físicas, sempre serão equiparadas a pessoa jurídica.

Não obstante, é importante lembrar que o Regulamento do Imposto de Renda estabelece, de forma bastante genérica e abrangente, que qualquer atividade econômica, quando exercida de forma habitual e profissional por uma pessoa física, com a finalidade de lucro, também será equiparada a pessoa jurídica.

Dessa forma, a pessoa física que compra e vende imóveis de forma habitual, ainda que não realize a construção, incorporação ou loteamento do imóvel, será considerada equiparada a pessoa jurídica para fins tributários, devendo apurar os impostos no regime do Lucro Presumido ou do Lucro Real.

Esse, inclusive, é o entendimento da Receita Federal, externalizado na recente Solução de Consulta Cosit nº 86/2020.

Como verificar a habitualidade na compra e venda de imóveis?

Não há na legislação tributária um conceito objetivo do que vem a ser habitualidade para fins de equiparação a pessoa jurídica.

No entanto, a Receita Federal emitiu a Solução de Consulta Cosit nº 147/2018, dizendo que a habitualidade é verificada quando as operações são realizadas de forma não eventual. Ou seja, quando fica denotada a intenção de permanência e continuidade no exercício daquela atividade.

A Receita Federal reconhece que não é possível aferir a habitualidade pela mera quantidade de operações realizadas em um determinado período de tempo, mas entende que esse critério pode ser um forte indicativo de habitualidade. Neste sentido, a habitualidade será verificada caso a caso.

Antigamente, quando ainda estava em vigor o Decreto-Lei nº 1.381/1974, o critério de “habitualidade” era bem objetivo:

  • Mais de 3 imóveis adquiridos a cada período de 1 ano; ou
  • Mais de 6 imóveis adquiridos a cada período de 3 anos.

Como esse dispositivo legal foi revogado, não podemos mais considerá-lo como um parâmetro seguro na realização de negócios imobiliários na pessoa física.

Não obstante, considerando a grande subjetividade desse tema, essas quantidades não deixam de ser um norte na avaliação dos riscos tributários.

Conclusão

Diante do exposto, a pessoa física que realizar com habitualidade a compra e venda de imóveis (ainda que não realize a construção, incorporação ou loteamento do imóvel), com a finalidade de obtenção de lucro, deverá:

  • Inscrever-se como Empresa Individual na Junta Comercial;
  • Obter o CNPJ junto à Receita Federal;
  • Tributar tais operações no Lucro Presumido ou Lucro Real;
  • Manter escrituração contábil completa;
  • Entregar todas as obrigações acessórias de pessoa jurídica ao fisco.

Portanto, se você deseja realizar operações imobiliárias com habitualidade, é importante estruturar o negócio desde o início de forma planejada, contando sempre com o auxílio de profissionais especializados nesse tema.

 

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